quinta-feira, 5 de agosto de 2010

UM PÁLIDO PONTO AZUL

quinta-feira, 5 de agosto de 2010


A espaçonave estava bem longe de casa.
De saturno, a Terra apareceria muito pequena para a Voyager apanhar qualquer detalhe, nosso planeta seria apenas um ponto de luz, um "pixel" solitário, dificilmente distinguível de muitos outros pontos de luz que a Voyager avistaria:
Já havia sido dito por cientistas e filósofos da antiguidade que a Terra era um mero ponto de luz em um vasto cosmos circundante, mas ninguém jamais a tinha visto assim.

Então, aí está - um mosaico quadriculado estendido em um fundo pontilhado de estrelas distantes.

Não há nenhum sinal de humanos nessa foto. Nem das construções sobre a superfície da Terra... nem nossas máquinas... nem nós mesmos...

Nós somos muito pequenos na escala dos mundos... humanos são irrelevantes, uma fina película de vida num obscuro e solitário torrão de rocha e metal...

Devido ao reflexo da luz do sol na nave espacial, a Terra parece estar pousada num raio de luz, como se nosso mundo tivesse um significado especial. Mas é um acidente de geometria óptica. O sol emite sua radiação eqüitativamente em todas as direções. Se a foto tivesse sido tirada um pouco mais cedo ou um pouco mais tarde, nenhum raio de sol teria dado mais luz à Terra.

Deste ponto distante de observação, a Terra talvez não apresente nenhum interesse especial. Para nós, no entanto, ela é diferente.

Olhem de novo para aquele ponto. É ali. É a nossa casa. Somos nós. Nesse ponto, todos aqueles que amamos...Todos os que conhecemos... De quem ouvimos falar... Todos os seres humanos que já existiram, vivem ou viverão as suas vidas.

Toda a nossa mistura de alegria e sofrimento, todas as inúmeras religiões, ideologias e doutrinas econômicas, todos os caçadores e saqueadores, heróis e covardes, criadores e destruidores de civilizações, reis e camponeses, jovens casais apaixonados, pais e mães, todas as crianças, todos os inventores e exploradores, professores de moral, políticos corruptos, “superastros”, “líderes supremos”, todos os santos e pecadores da história de nossa espécie, ali - num grão de poeira suspenso num raio de sol.

A Terra é um palco muito pequeno em uma imensa arena cósmica. Pensem nos rios de sangue derramados por todos os generais e imperadores para que, na glória do triunfo, pudessem ser os senhores momentâneos de uma fração deste ponto. Pensem nas crueldades infinitas cometidas pelos habitantes mal distinguíveis de algum outro canto em seus freqüentes conflitos, em sua ânsia de recíproca destruição, em seus ódios ardentes.

Nossas atitudes, nossa pretensa importância, a ilusão de que temos uma posição privilegiada no universo, tudo é posto em dúvida por este ponto de luz pálida. O nosso planeta é um pontinho solitário na grande escuridão cósmica circundante. Em nossa obscuridade, no meio de toda essa imensidão, não há nenhum indício de que, de algum outro mundo, virá socorro que nos salve de nós mesmos.

A Terra é, até agora, o único mundo conhecido que abriga a vida. Não há nenhum outro lugar, ao menos em futuro próximo, para onde nossa espécie possa migrar. Visitar, sim. Estabelecer-se, ainda não. Goste-se ou não, no momento a Terra é o nosso posto.

Tem-se dito que Astronomia é uma experiência que forma o caráter e ensina humildade.

Talvez não exista melhor comprovação das loucuras da vaidade humana do que esta distante imagem de nosso mundo minúsculo. “Para mim, ela sublinha a responsabilidade de nos relacionarmos mais bondosamente uns com os outros e de preservarmos e amarmos o pálido ponto azul, o único lar que conhecemos.”

Carl Sagan - Astrônomo Americano.

(de “Um pálido ponto azul”, 1994).

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