sexta-feira, 16 de março de 2012

O ÚLTIMO SUSPIRO É O DA MÃO

sexta-feira, 16 de março de 2012
[arte de Leonardo da Vinci]

Os doentes terminais ficam com o punho fechado, preocupados com a próxima pontada, controlando o retorno do soluço, antecipando o lugar dos tremores. 


Não abrem a mão, fincam as unhas na palma, podem se machucar e rasurar as linhas do destino. 


Estão concentrados em seu próprio sofrimento, atentos ao som como uma noite sem estrelas. 


As enfermeiras criaram um truque para aliviar a dor: colocam entre os dedos dos pacientes uma luva com água morna dentro. 


É um faz-de-conta. É como se um familiar segurasse a mão deles naquele momento de angústia. 


Os doentes se tranquilizam, se acalmam, e o braço se solta para a janela. 


Na despedida, dependemos somente de uma mão segurando a nossa. Tolos ou gênios. Toscos ou eruditos. Todos somente procuram o corrimão de uma amizade. O corrimão de um parente para descer os degraus da morte, suportar a penumbra e não cair desmemoriado nas lembranças. 


O último suspiro é o da mão, não da boca. O poeta Goethe não disse 'Licht! Licht! (Luz! Mais Luz!) em sua derradeira exclamação. Foi um lamento prosaico, comum, destinado a sua neta Ottilie: "Me dá sua mão". 


A mão de quem a gente ama é a nossa luva. Mas com sangue quente a encurtar os batimentos cardíacos espaçados pelo fim. 


A mesma mão de sempre e tão nova. 


A mão materna na hora de atravessar a rua. A mão paterna mexendo de orgulho nossos cabelos. A mão da caligrafia dos cadernos, com a cabeça inclinada na mesa. A mão brincando com o graveto na boca do cachorro. A mão boba no cinema. A mão para levantar o véu branco da esposa. A mão ansiosa a segurar o primeiro passo do filho. 


A mão assustada de ternura. Ossuda, magra, com as veias azuis pedindo passagem. Envelhecida, absolutamente carente, que vai acenar de verdade apertando outra mão. 


[Fabrício Carpinejar]





Você vai aprender, filho. Que a intensidade pode roubar você de si mesmo. Que é preciso leveza para se pertencer. Você vai aprender a se distrair no meio do caminho – para ter o privilégio de errar. Vai aprender que as descobertas estão nos atalhos. E que é preciso alcançar o escuro denso para estar diante de todas as possibilidades. Você vai aprender a se deitar noite escura e amanhecer ensolarado. E vai entender que na perda mora o verdadeiro começo. Talvez você leve meia vida para isso. Talvez mais, como eu. Mas até lá, olha que sorte: eu vou estar segurando a sua mão.

[Cris Guerra]

10 bilhetes:

Unknown disse...

Gi, que bonito texto, gostei muito e me tocou profundamente!bjs Nina

Gislene disse...

Nina,

você vê,
como uma simples mão faz toda a diferença!

Eu amo o Fabrício Carpinejar.

Um beijo querida! :)

Milton Kennedy disse...

Lindo, emocionante!

Abraços e paz!

Gislene disse...

Um abraço Milton!

Muita paz pra você!

Cris Carvalho disse...

Você me acende a esperança, dona bonita! É tudo o que eu quero, escrever um livro!

A minha maior alegria é ouvir esses carinhos todos vindos de vocês ...

Agradeço e muito.

beijocas iluminadas!

Gislene disse...

Cris, acredite!

Um beijo.

lis disse...

Fiquei até emocionada com o poder das mãos,principalmente na passagem dessa vida pra outra. rs
magino que seja de segurança como se criança fosse!
abraços Gislene
Boa escolha

Gislene disse...

Lis,

um beijo!

Maria José Rezende de Lacerda disse...

Postagem maravilhosa, Gislene. Fiquei emocionada. Beijos.

Gislene disse...

Maria José,

um beijo no seu coração!

 
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