[Renoir, The Umbrellas (Les Parapluies), de 1883]
"Sempre me restará amar (...) Amar não acaba. É como se o mundo estivesse a minha espera. E eu vou ao encontro do que me espera."
[Alice Ruiz]
Quando estamos viajando, desde a saída meu filho resmunga: estamos chegando? Afirmo que sim, apesar de faltarem 300 quilômetros.
Cinco minutos depois, lá vem ele com a mesma pergunta: estamos chegando? Por mais que ande rápido ou vença o trajeto, nada o demoverá da teimosia de querer descer logo ou de ser informado com detalhes de onde está.
Estar chegando revela a ansiedade em definir os relacionamentos. Fala-se da proximidade para afugentar a distância. Não é uma mentira, é uma verdade afoita. Apressamos em dizer que amamos para não conviver com as dúvidas e tampouco gerar suspeitas da legitimidade do sentimento.
Há uma pressa pelo final em todo início e há uma pressa pelo início em todo final. É obrigatório dizer "eu te amo" para continuar e formalizar o laço.
Talvez seja paixão, mas "eu te amo" já pula da garganta. Talvez seja atração, e "eu te amo" fica sentado na primeira fila. Talvez seja carência, e "eu te amo" puxa a ponta da camisa e da língua para a frente. Não que seja desonesta a declaração, pois não definiremos ao longo dos dias quando se ama verdadeiramente.
A precipitação é um modo de garantir, de tomar conta. Não se vive de porta aberta, "eu te amo" é a chave. Ama-se com o quarto fechado. É dito para fazer valer o esforço da conquista, coroar a sedução, assegurar que aquela pessoa é sua, e que não mais corre o risco de perdê-la. Caso nenhum dos dois fale, amarga-se uma sensação de inutilidade e de desprezo.
Não existe como sair ileso da encruzilhada: se não apregoamos o "eu te amo", somos insensíveis; se declaramos toda hora, pode se tornar um aceno, mero cumprimento. É preciso cuidar para que não seja usado sem vontade. Um selinho não é suficiente para mandar a carta. Sem desejo, o "eu te amo" é saudação de lápide; entra-se no território da proteção e da rotina, para se despedir de amar. Servirá para afastar o beijo quando deveria prolongá-lo. E as atitudes, e as outras palavras não contam?
Quantas vezes proclamamos o amor precocemente? Antecipamos para que, de fato, venha. Prometemos para depois ver se acontece. Ainda que incomparável, o amor se faz pela comparação com experiências anteriores. Define-se pela sua força em sobrepujar as lembranças. É a superação do que foi vivido que valida ou não sua intensidade. Não representa o amor, e sim uma nova tentativa de amar.
Será que o amor não é tão-somente vontade de amar?
Não chegarei, amor é estar a caminho.
[Fabrício Carpinejar, crônica 'Estamos chegando?' do livro Canalha!, Editora Bertrand Brasil]
2 bilhetes:
Vim lhe deixar um bilhetinho.
Realmente estes dias de ansiedade e de buscas rápidas, dos quereres e das obrigatoriedades... Muito bom este textos que serve para nos dizer - TIRE SEUS PÉS DO FREIO DE VEZ EM QUANDO - chegar tão depressa pode não ser tão bom, pois deixamos de curtir, apreciar o colorido do percurso.
Um grande abraço
É verdade, Malu!
Um beijo, tenha um lindo dia!
:)
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